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O luto é o momento mais solitário do ser humano

18/04/2020 às 20:40
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Miriam Morata
@miriammorata | Arquiteta
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"A morte não existe, dizem alguns, mas como desmentir a cama vazia, a cadeira de rodas abandonada no banheiro, o molho de chaves que sempre esteve pendurado na calça dele e agora está jogado em uma gaveta qualquer, a caneca amarela que ela tomava café e agora é um vaso, a caneta que sempre esteve no bolso da camisa dele e já não tem mais tinta, nem função?"

Míriam Morata Novaes in Alzheimer diário do esquecimento


A hora mais dolorida não é quando fecham o caixão, mas acordar na manhã seguinte e descobrir que não foi pesadelo, a ausência é real, o tempo vai se arrastar, o silêncio testemunha a minha perplexidade diante da constatação, de que ela não vai me chamar nunca mais.

As horas mais doloridas da vida, não podem ser compartilhadas ou evitadas. A dor do luto é solitária e não existe nenhuma linguagem, que consiga traduzir essa ferida que parece rasgar a Alma... só o silêncio.

Durante os últimos anos mamãe preencheu todas as horas dos meus dias, e quando não estávamos fisicamente juntas, ela preenchia todo espaço da minha preocupação e do meu amor. Ela saiu e deixou um vazio enorme, mas ainda não é hora de caminhar pelos lugares onde ela passou, sentar na cama em que ela dormia, olhar a fotos e tomar café na caneca amarela que ela adorava. Ainda não!

O luto exige respeito e tempo, ninguém consegue estancar o sangramento dessa ferida; nenhum abraço, ou mão estendida podem amparar os passos de quem está de luto; nenhuma palavra pode oferecer paz a essa Alma.

Luto é momento de mergulhar nas lembranças, no vazio que ela deixou, no medo do futuro; é hora de brigar com Deus e cobrar tudo o que a fé havia prometido; hora de chorar até adormecer de cansaço.

O luto é o momento mais solitário do ser humano, mais visceral e doloroso, por isso é preciso descer até o mais fundo dessa dor, para esgotar o medo, a ira, o vazio, as culpas imaginadas, o remorso e a ausência, que parecem preencher todos os espaços, todas as horas.

É a noite escura da Alma.

É o momento em que a morte parece mais sedutora do que a vida.

Mas nenhuma noite resiste ao amanhecer e depois da escuridão, a Luz começa a entrar pelas frestas do medo e da saudade. A vida chama, ainda que a princípio seja quase um sussurro, cada célula do corpo consegue identificar esse chamado.

Começar é difícil, porque esse não será um começo qualquer, mas o renascimento de alguém que conheceu a noite escura da Alma, e sobreviveu.

Os primeiros passos desse novo caminho são lentos e pesados, como se os pés caminhassem sobre areia movediça; se por um lado isso dificulta a velocidade e tira o prazer da caminhada, por outro, fortalece as pernas para que, quando os pés pisarem na terra firme, consigam correr na planície ou na montanha, nas trilhas ou pântanos; no deserto ou na floresta... e nenhuma pedra será obstáculo, mas um banco para sentar e apreciar a paisagem, antes de continuar a caminhada.

Míriam Morata sentada na pedra.

Miriam Morata
@miriammorata | Arquiteta
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Miriam Morata
Arquiteta
Petrus, o susto é nosso, o desamparo diante do luto também é só nosso e a compreensão depois de tudo é só nossa.
26/04/2021 às 20:23
Petrus Barbosa
Advogado
Oi, Miriam. Suas palavras rasgaram certeiramente no meu coração. Perdi a minha avó há quase um ano, e durante toda a sua jornada no Alzheimer, eu a cuidei todos os dias. Hoje ainda sinto um luto profundo pela perda dela e acabo me pegando na ideia como esse sentimento é tão solitário... Não há como expressar com completude para os outros o que se sente. É uma coisa atrelada a somente o nosso ser... E isso angustia...
24/04/2021 às 14:34